Francisco Barão Lourenço

Nome do Pai: 

Antonio Barão

Nome da Mãe: 

Maria Lourenço

Data de Nascimento: 
1878-01-04
Local do Registo: 
Santana de Cambas
Distrito / Pais (se for estrangeiro): 
Beja
Concelho: 
Mértola
Freguesia: 
Santana de Cambas
Local de Nascimento: 
Picoitos
Estado Civil: 
Casado
Nome do Cônjuge: 
Data do Casamento: 
1901-05-12
Local do Casamento: 
Corte do Pinto
Residência - Localidade: 
Mina de S. Domingos
Data de Falecimento: 
1967-11-22
Local de Falecimento: 
Mina de São Domingos
Informação Pessoal: 

Em 1942 aparece recenseado como escriturário.

Assento de Nascimento: 
Assento de Casamento: 
Empresa: 
Mason and Barry, Ltd.
Nº. do Sindicato: 
228
Data do Registo: 
1892-11-20
Nº de matricula: 
9016
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Nº da Caixa de Previdência: 
1775
Departamentos: 
Serviço Geral
Profissão / Categoria: 
Mordomo
Local de Trabalho: 
Mina de S. Domingos
Ficha do Sindicato: 
Notas adicionais: 

Ainda mal lhe pintava o buço, quando o meu avô Francisco se apresentou no Palácio levando uma cesta pelo braço, iria doravante trabalhar a fazer mandados para os ingleses. Seria o melhor dos destinos aquele que lhe calhou em sorte, pior seria andar debaixo da terra a cavar pedras alumiado pelo gasómetro.
Caiu no goto dos ingleses, tanto que esteve lá sessenta e tantos anos, tinha um feitio dócil e cordato, a sua prontidão cativou-os e em pouco tempo já largara a cesta, seria mordomo e carregava o molho de chaves que abria as portas importantes da residência da administração, nomeadamente o armário onde se arrecadavam os uísques e as latas de tabaco.
Um dia, já na idade madura, o coronel despediu-se para voltar a Inglaterra e gozar a merecida reforma, não foi sem se despedir do meu avô oferendo um relógio fino, Um Zenith comprado em Lisboa na Rua da Prata e com as iniciais dele gravadas, nele se agradecia ao mordomo os serviços prestados à família Cross Brown. Ainda hoje guardo o relógio do meu avô.
Bem antes disso, estando eu a chegar à idade de procurar governo para a vida, o coronel Cross Brown, o velhote, ouvindo dizer ao seu mordomo que tinha um neto com préstimo e bom corpo para trabalhar, no pleno gozo dos seus poderes de administrador, interessou-se e perguntou:
- Xico! Queres um lugar para o teu neto? Nos escritórios? Ou nas oficinas?
Um lugar na contramina não era coisa que se oferecesse a quem se tinha em consideração. O meu avô agradeceu a estima da oferta e explicou que nos escritórios não, contas e letras não eram com ele, o rapaz queria antes ir para as oficinas aprender um ofício. E foi.
Pela manhã eu e o meu pai comíamos uma açordinha ao levantar, antes de irmos para o trabalho, de caminho ao passar no Págo Velho, comprava à senhora Maria das batatas uma batata-doce assada para a merenda do meio-dia, e era cantarolando que dava entrada na oficina dos electricistas onde fui colocado.
Os aprendizes como eu, eram colocados em tarefas simples, todas as manhãs tinha de percorrer os candeeiros de iluminação pública no bairro dos ingleses, bem como os das instalações da mina a aferir do bom estado das lâmpadas para que se procedesse á substituição das fundidas, aquela zona residencial da mina não poderia parecer um bairro cafre de um qualquer subúrbio do mundo.
E a pouco e pouco ia aprendendo do ofício. Para acelerar o ritmo da aprendizagem, um colega mais velho, o Xico Palma, ofereceu-se para nos dar lições de electricidade a mim e mais dois novatos, tinha mandado vir de Lisboa um livro grosso, um curso de electricidade prática. As lições eram dadas após o horário normal de trabalho, na sua casa ao Bairro Alto, numa viela estreita de casas empoleiradas em chão rochoso e sem qualquer espécie de iluminação pública, que essa ficara lá por baixo no bairro dos ingleses.
Era à luz de candeeiros de petróleo que aprendíamos electricidade no livro, fazíamos questionários de avaliação, tomávamos apontamentos e desenhávamos instalações eléctricas numa folha de papel pardo. No final das lições, passados vários meses, já nos sentíamos a ser mestres e mais tranquilos com a iluminação dos outros que moravam lá em baixo. Fomos a contas, mas o Xico não queria receber nada, ele tinha interesse sem ter interesse nenhum, o que fazia era por vontade de ajudar, de nos querer ver singrar na vida, era desconcertante tanto tempo que lhe tomámos, tanto petróleo que gastámos naqueles serões e não se lhe fazia uma fineza? Sabíamos que o homem fumava, então fomos ao armazém e comprámos um pacote de maços de cigarros, Definitivos.
Ainda fui muito a tempo de me fazer bom na minha profissão, de assistir ao iluminar do mundo todo. Os anos foram passando, cada vez mais agarrado ao relógio do meu avô, encostava ao ouvido o tictac mansinho do seu maquinismo, a marcar o tempo das minhas rugas.
O relógio marcou-me o compasso, até que um dia destes paramos ambos de andar e então se apaga a luz do mundo.
Recolha de Pedro Faria Bravo