Domingos Nunes Paulino (Biografia)

Domingos Nunes Paulino

Nasceu no Bairro Alto da Mina de São Domingos a 21/09/1918 freguesia da Corte do Pinto-Mértola Filiação:Domingos Nunes(Apontador de mina-contratista) e Brázia Maria Paulino(Estevão)


Domingos Nunes Paulino aos 6 anos de idade (Bairro Alto 1924)

 

1939-1940-soldado telegrafista em Estremoz Regimento telegrafistas 5ª (153)TPF Batalhão telegrafistas (153) 4º grupo:"Sabe ler, escrever e contar correctamente." Alistado em 15/07/1938 Incorporado em 27/10/1939 escola recrutas em 5/2/1940

"Louvado pelo comandante do regimento de cavalaria nº3 por ter mostrado valioso auxilio nos trabalhos de instalação eléctrica das nossas cabines e outras instalações com manifesto zêlo(...)muito boa vontade para além das horas de serviço da sua especialidade.Prémio de 10 dias de licença(...)


Domingos Nunes Paulino no serviço militar em 1940

 

Ocupação:Electricista na Mason & Barry Data do Registo na empresa: 1934-07-24 (quase a completar os 16 anos de idade).


Homens da Mina, o de fato claro é Domingos Nunes Paulino

 


Grupo de electricistas da Mina, o primeiro da direita é Domingos Nunes Paulino

 

Autodidacta decidiu já na sua vida adulta concluir a 3ª classe, fazendo o respectivo exame para não dizer que o não tinha. Nessa altura já falava, escrevia e mais tarde ensinava um idioma internacional que se chama "esperanto". Este idioma foi proibido durante o Estado Novo.

Humanista e lutador anti-fascista.

Foi detido e preso na cadeia do Aljube entre 1949 e 1950, ano da candidatura eleitoral de Norton de Matos, sob a acusação de “atividades e organização da associação secreta e subversiva que denominam por “Partido Comunista Português”. Com ele, foram também presos, Augusto Bento Valadas Molarinho, José Luís Valadas, conhecido como “O Flores”, Francisco da Graça Pedro e Joaquim Martins Damásio

Nos anos de 1954 ou 1955 criou um grupo de teatro em Santana de Cambas que chegou a realizar algumas actuações na Mina de São Domingos.

Na 2ª metade dos anos 50 deixou o Alentejo tendo trabalhado e residido em Lisboa e Paris de onde regressou nos anos 80.


Grupo de homens na Mina de São Domingos, o da direita (no grupo) é Domingos Nunes Paulino, o da barba preta é o conhecido barbeiro Francisco Pires

 

Faleceu na Amadora no dia 23 de Fevereiro de 2015.

 

Carta

 

De: Jacinto Costa Chaves - Entradas - Baixo Alentejo
Para: Exmº Snr. Domingos Nunes Paulino - Soldado telegrafista nº 153/39/S - Regimento de Cavalaria 3 Estremoz Entradas, 23 de Outubro de 1940

 

Meu caro amigo
Desejo bastante que ao receber desta se encontre de saúde, assim como todos os nossos amigos. Se só hoje responda á sua prezada carta datada de 10 do corrente mês; é porque queria contar-lhe algumas palavras da célebre feira de C.V como deve saber teve lugar nos dias 19, 20 até 23. Pois eu abalei domingo e só hoje regressei já deve fazer uma idea quanto massado devo estar: mas não devo exitar em escrver-lhe não quero que o amigo suponha que esqueço os camaradas.
Não acha interessante a minha tão grande demora na feira sem ter negócios? Pois uma sopeira é que foi a causadora de tudo isto; chego até ter pena de gostar tanto do belo sexo, mas para a frente é que se caminha não acha? Sempre vos digo alguma coisa sobre a feira o que já deve fazer idea o que seja, pois prostitutas eram em grande numero, cada vez se vê mais miséria todos pensavam em vender visto a crise que o Alentejo atravessa deve ser das maior até hoje conhecidas centenas e centenas de desempregados a braços bom a miséria sem terem que comer e nem dar aos filhos, e o governo não lhe interessa o mal do povo! As camaras nada fazem e continua-se sofrendo porque não valhem de nada as suplicas deste martirisado povo….! Queremos trabalhar”
À dias um numero de 450 homens de C.V. foram á Camara pedir trabalho e disseram-lhe que fossem pedir; nada podiam fazer, e dividindo-se em grandes grupos foram pelas ruas batendo de porta em porta pedindo esmola: recordou-me a camarada “já leu?” e passados dois dias apareceu às portas dalguns ricaços um papel dizia: queremos trabalho… e seguia-se a lista do nomes e dizendo estes cortasse-lhe a cabeça: passadas algumas horas chega a C.V uma camioneta carregada de metralhadoras e uma força de Cavalaria, disiam que o povo estava revoltado, enquanto devia dar pão aqueles infelizes mostrão lhe metralha. já faz o amigo idea o que aquela gente será capaz de fazer amanhã e só arranjaram trabalho para 300 e os outros morrerão de fome pelo que vejo passei à Funcheira disseram-me que desenas de mineiros (Aljustrel) pediam esmola em C.V. gare era pena verem-se grupos de raparigas a pedir; bem vestidas pois eram em parte costureiras filhas dos infelizes mineiros que viviam satisfeitos e felizes e hoje veem-se reduzidos á miseria. existe tanta sede de vingança que mais não pode ser, não é possível que dure por muito tempo esta situação a violência será inevitável e a sua aparição. Termino por falta de espaço diga ao xico que a familia espera carta dele recomende a todos e abraça-o seu amigo certo
(a) Jacinto Chaves

P.S. Caro Nunes Peço-lhe que diga ao gato que logo que mandem a encomenda não esqueça os enanicolos e as alssas e o amigo logo que receba o dinheiro paga os livros a caneta e deve sobrar dinheiro que
chegue para me tirar meia dúzia de fotografias á “paisana” por esse que ofereci ao gato se ele o não tiver vá à do Romão que lha emprestará.
Essa rapaziada deve estar zangada comigo mas não é por mal que não escrevo em vendo o Romão dei-lhe recomendações Barra e aos sapateiros da oficina onde nós hia-mos ás vezes quero dizer o colega que foi apresentar despedidas á cama, p’ra frandina não escrevi porque não sei a direcção e alem disso pouco deve interesar mas sempre que é cultivar terra para você semear diga ao Manuel que eu penso em ir para Lisboa e em tendo a certeza lhe escrevo para ver se calha uma ocasião de ele estar lá. Sobre Lisboa direi qualquer coisa logo que tenha esperança de me colocar, não será preciso o xico saber isto percebe? Não é por mal!... Então o Vabouca como vai? com as suas “coijas” recebi hoje as Meninas de Pilar. Não sei se conhece um livro que é: Os Sindicatos Operários e a Revolução Social coisa formidável. Tenho e não sabia.

Nota: transcrito conforme documento dactilografado pelo agente da PVDE
Trabalho de pesquisa realizado pelo DR Miguel Rego e publicado no boletim informativo da C.M de Castro Verde-O Campaniço nº77 de Maio/Junho/Julho de 2008 artigo intitulado "Recordar um antifascista-Jacinto António Chaves" o artigo em questão é baseado numa carta endereçada ao meu avô Domingos Nunes Paulino na altura soldado telegrafista.

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